Eu tinha sete anos e estava na segunda série. A festa junina se aproximava e a professora juntou todos nós no pátio. Diante das carinhas curiosas, ela disse que cada um deveria escolher seu par para a quadrilha. Silêncio total. Olhares nervosos. A tensão era enorme para aqueles miniseres humanos, diante de talvez uma de suas primeiras interações sociais daquele tipo - a que confronta homens e mulheres, desperta paixões e medos, vontades e vergonhas, amizades e disputas.
Notei a demora na resposta e as bochechas vermelhas e olhares vacilantes que me cercavam. Levantei o dedo.
- Eu escolho o Gustavo.
Todos olham para mim, como se pedissem uma explicação. Ora, se é necessário, lhes dou, com a maior naturalidade:
- Não chamam ele de fantasma? Então ninguém vai me ver com ele!
Sorrio, satisfeita comigo mesma. Aos poucos, os coleguinhas tomam coragem para escolher seus pares. Eu não presto atenção. Já tinha salvado o dia.
Outro dia, me lembrei disso. E, pela primeira vez, percebi que a turma toda deve ter pensado que eu gostava do Gustavo, inclusive o próprio. O mais engraçado é que essa questão nem passou pela minha cabeça, nem naquele dia, nem depois. Me apaixonei ainda mais pelo meu eu-criança, o ser mais livre que já conheci.