A sociedade de controle, apelidinho querido para a nossa sociedade insana (quer dizer, um conceito do filósofo francês Gilles Deleuze), é regida pela lógica da empresa. Vivemos os tempos do empreendedorismo. Falamos em investimentos o tempo todo: investimos em filhos, investimos em nós mesmos, investimos em relacionamentos, e ficamos chateados quando esses investimentos não dão o lucro esperado e perdemos tempo, a moeda corrente da sociedade de controle. A empresa está em nós 24 horas, trabalhamos em casa, pensamos na empresa até dormindo, somos a empresa nas redes sociais, ela está na construção da nossa identidade, em nossas relações. Não mais o corpo, a empresa quer a nossa alma.
Vivemos uma moratória ilimitada (outro conceito de Deleuze). Nunca quitamos nada, estamos sempre devendo. Devemos estudar, trabalhar e ser jovens para sempre, tudo isso ao mesmo tempo, já que envelhecer é quase indigno. Devemos ser produtivos, ter autoestima elevada, ser poderosos, elegantes, bem-sucedidos. Devemos ser felizes, e o que é ser feliz hoje? Não só hoje, mas o que é o "ser feliz" de cada época? "Ser feliz" não sempre foi um conceito relativo, individual, intransferível? Para a sociedade, com suas estruturas e expectativas para cada faixa etária, gênero e classe social, nunca foi, mas deveria ter sido.
Ainda deveria ser. E ainda pode ser, para aqueles que conseguem destrinchar as barreiras do senso comum, enxergar que o natural é quase sempre algo construído e pactuado socialmente, contra o qual é possível resistir.
Voltando à lista: pedir demissão de um emprego para se dedicar a um projeto pessoal, seja ele qual for, pode parecer loucura ou fraqueza, mas há um quê de revolucionário nessa atitude. Há a coragem de quem calou todas as vozes, internas e externas, que dizem que dinheiro nunca é suficiente, que poupanças devem sempre crescer, pois quem sabe do futuro, não é mesmo? Há a sabedoria de se usar o dinheiro que já se ganhou para ajudar a si mesmo (não é para isso que ele serve?), e de pedir ajuda, quando há quem pode ajudar. Há a satisfação de investir em algo que escolhemos, com retorno para nós exclusivamente, e não para um chefe, um prédio sem alma (vê? Já estou falando de investimento e retorno, é muito difícil sair da lógica do sistema, mas o primeiro passo é enxergá-la). Há a alegria de sonhar, e até de ter tempo para realizar.
É revolucionário recusar passar os dias inteiros de semanas inteiras preso em um lugar que não é seu, em todos os sentidos. Mas sabe o que eu acho? Deveria ser mais natural.
Dedico aos meus amigos que acham naturais muitas coisas loucas e loucas muitas coisas naturais. Às vezes, não se encaixar é algo bom.
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